
O Sedã Médio e o Ego no Divã
O sofá macio depois de um dia de trabalho
Eu sempre achei sedãs antiquados, e assim como minha cabeça juvenil desprezava hatches médios, tem coisas que você só se dá conta quando fica mais maduro. Recentemente, ao avaliar um Honda Civic Advanced Hybrid, não entendia o frenesi de alguns colegas de trabalho, que rasgavam enorme seda ao modelo.

Uma semana depois, teste pronto e entregue ao público, me peguei refletindo sobre sedãs desse tipo. No caso do Civic, não é um sedã qualquer, ao beliscar os R$ 266 mil, ser híbrido e ter muitas qualidades. Mas a maior delas foi me fazer enxergar quem compra (e porquê) esse tipo de carro.
Se ponha no lugar deste pobre coitado hipotético que eu e você, caro leitor, criamos. Essa pessoa trabalha muito, e cansada deste, entra no carro para fazer qualquer coisa, seja voltar para casa ou ir ao mercado, e lá quer se desconectar do externo, por um pouco que seja. “Mas qualquer carro faz isso”, sim, mas sedãs fazem diferente.

Veja, num hatch/sedã compacto, as pequenas dimensões apenas te protegem, mas um tanto enclausuram independente de ser magro, gordo, alto ou baixo. Além disso, não isolam, uma vez que os ruídos e vibrações invadem a cabine, e roubam sua tranquilidade. Num SUV, a situação muda de figura, mas não muito.
Alto e longe dos outros, você até tem espaço e menos vibrações, mas se isola tanto, que precisa redobrar sua atenção para não invadir a vida dos outros (se você tiver bom senso ao volante, claro). A altura não faz sua direção ser tão precisa, então abdicar da dirigibilidade, na maioria das vezes, é obrigatório.
É aí onde entra o sedã médio. Ainda que seja um símbolo de excesso, tem a dirigibilidade necessária para lhe manter perto do chão, e a altura ideal para isolar-te, sem excluir sua atenção por completo. Classismos à parte, em sua maioria, tem também os luxos necessários para tornar sua estadia agradável.

Bancos macios, ar e direção capazes de desestressar o mais pilhado dos condutores e linhas agradáveis (se não abrutalhadas) são geralmente a receita para o sucesso. A soma disso tudo entrega uma condução, sejamos francos, pouquíssimo emocionante. Mas essa é a graça. Não ter a mínima pressa, e deixar a máquina fazer o serviço sujo.
Não entro na conta de sedãs elétricos, esportivos, manuais ou mesmo tão tecnológicos que lhe tratem como um completo boçal ao volante. Me refiro ao sedã médio clássico, o que você está imaginando agora: câmbio automático, direção hidráulica/elétrica, ar gelando e um rádio/multimídia funcional.

Por um momento, deixe sua mente imaginar um carro dessa natureza em suas mãos. Uma ida ao mercado marcada por uma condução tranquila, sem firulas e erros. Deixar seu corpo cansado acomodar-se ao veludo/couro sem remorso, e nenhum outro pensamento sobre perrengues automotivos. Nada de calcular ultrapassagens ou mesmo incomodar-se com barulhos/buracos.
Conseguiu imaginar? Isso é um sedã médio que se preze. Claro, o visual executivo, sisudo e necessariamente envelhecido pode não agradar a todo mundo, mas ache um que TE agrade. Ainda que essa não seja a sua praia, permita-se imaginar-se a bordo de um veículo assim. Talvez isso seja o mais próximo de paz sem compromisso que se pode chegar, creio eu.
Mas quem sou eu para te dizer o que fazer, não é mesmo?